quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Teologia da revolução



Álvaro Cunhal apresentou-se durante um importante período da história da União Soviética como um modelo de dirigente comunista e atingiu um elevado nível de reconhecimento entre os seus correligionários internacionais. Beneficiou de um estatuto que durou largos anos e que lhe permitiu viver com tranquilidade em Moscovo e em França com o apoio directo do Partido Comunista da União Soviética (PCUS) e circular por todos os países socialistas com considerável liberdade de movimentos. A classe dirigente reconhecia-lhe mérito político, empenho pessoal e, acima de tudo, reconhecia-lhe a necessária disciplina revolucionária. Cunhal prescindiu de uma parte da sua vida e dos afectos para se dedicar a uma causa de inspiração transcendente que exigiu submeter-se a intensos sacrifícios físicos e psicológicos. O seu percurso tornou-se numa teologia da revolução. A convicção férrea e a dinâmica emocional controlada permitiram-lhe suportar as privações com a mesma determinação com que penalizou os que abriram brechas na couraça revolucionária. Também revelou uma profunda intolerância e desprezo para com os dissidentes intelectuais e criticou duramente os que cederam às torturas físicas por comprometerem a segurança colectiva e a moral revolucionária. A disciplina e a fidelidade tornaram-se dogmas de comportamento.

2 comentários:

Tentativas Poemáticas disse...

Sr. Dr. Adelino Cunha
Tenho vindo a acompanhar, com particular interesse, a divulgação do seu livro através dos órgãos de comunicação social.
Álvaro Cunhal tornou-se numa figura mítica – por vezes assustadora – durante a minha infância e adolescência.
Embora nunca o tenha conhecido pessoalmente, cedo aprendi a respeitar o seu percurso bem penoso durante as tenebrosas décadas da ditadura.
O meu saudoso pai foi admitido no Arsenal do Alfeite aos 14 anos de idade com a categoria profissional de Aprendiz de Serralheiro. Nesse tempo era descontado a cada trabalhador fabril o valor duma caixa de fósforos, com os quais se acendiam as fornalhas. Com muita dificuldade estudou e, como era dotado para as artes: escrita, desenho, pintura e escultura, viria a trabalhar na então chamada Sala do Risco como Desenhador Naval. Como Serralheiro foi aprendiz dos irmãos Victor Hugo e Jaime Serra, tendo este último feito parte do Comité Central do PCP.
Acometido de esgotamento cerebral em serviço, pois o meu pai trabalhava “a prémio”, foi submetido a tratamentos psiquiátricos agressivos, tais como electrochoques.
Ao cabo de três anos de doença foi sumariamente despedido, sabendo os camaradas e a família que aquele despedimento se ficou a dever ao facto de o haverem considerado comunista.
Por esta altura do ano (Natal) passeava com o meu pai e o Sr. Victor Hugo (recordo-me tão bem da sua baixa estatura física e da boina galega preta) na baixa de Lisboa. Habitávamos na Travessa da Madalena, perto do Poço do Borratém e deslocávamo-nos até ao Terreiro do Paço.
Recordo muito bem que, durante aqueles três longos anos de miséria, todos os Sábados, invariavelmente, apareciam na nossa casa três camaradas transportando um envelope com uma parte do salário que angariavam em colecta, às escondidas, claro, nas instalações fabris do Arsenal.
Foi esta a ideia que sempre me acompanhou ao longo dos anos: os comunistas eram pessoas altruístas, solidárias, lutavam por ideais políticos na sombra mas com determinação.
Para comentário já vai longo este meu texto, porém quis manifestar-lhe o meu respeito pelo seu trabalho e parabenizá-lo.
Abraço
António

Tentativas Poemáticas disse...

Sr. Dr.Adelino Cunha

Este espaço não aceita o comentário que elaborei - considerado longo - manifestando-lhe o meu respeito pelo seu trabalho. Parabéns.
Abraço
António Pais